segunda-feira, 25 de maio de 2009

Como reage o consumidor à crise?

Num ano em que as famílias em Portugal se endividaram mais 129% que em 2007, o desemprego subiu, a crise afectou a confiança e o consumidor reagiu com mais compras por menos valor, valorizando as marcas da distribuição. O consumidor tornou-se, assim, mais racional, mais infiel e mais “amigo” das MDD.


Os padrões de consumo sofreram profundas alterações com o acentuar da actual crise económico-financeira mundial. Um estudo recente, apresentado pela TNS durante a realização da Alimentaria Lisboa 2009, revela que, em Portugal, se registaram quebras no consumo de vestuário, combustível, produtos de drogaria e higiene e alimentação fora do lar.
Em contraponto, a alimentação dentro do lar registou uma subida, admitindo o estudo que o consumidor se tornou mais racional, mais infiel e mais amigo das marcas de distribuição (MDD).


+ Racional e infiel

Se até ao Verão passado, diversos estudos apontavam para a crescente preocupação com a saúde, aparecendo o preço em segundo lugar na mente do consumidor, o TNS Worldpanel LifeStyles 2008 mostra que o preço se tornou no factor chave no final de 2008, muito devido ao acentuar da actual crise económica global. Segundo os dados, 87% dos consumidores portugueses admitem que utilizam cupões de desconto sempre que possível e 77% efectuam comparações de preço entre as diversas marcas antes de fazer qualquer opção de compra na loja. Além disso, são cada vez mais (73%) os consumidores que verificam o preço quilo/litro e não apenas o preço do artigo, enquanto 71% admite ser um cliente objectivo, ou seja, cada vez mais se deixa conduzir pela cabeça e menos pelo coração.


A maior racionalidade do consumidor actual está claramente canalizada para a alimentação, verificando-se que entre 2007 e 2008 o peso dos FMCG (Fast Moving Consumer Goods) passou de 69,5 para 72,6%.
Esta maior racionalidade do consumidor tem um claro reflexo na (in)fidelidade que este possui relativamente à(s) insígnia(s), mostrando os dados da TNS que, apesar do universo retalhista possuir menos dois players em 2008 (Carrefour e Plus), o consumidor divide os gastos por mais insígnias, passando o número médio de insígnias visitadas por lar de 4,4 (2006) para 4,6 (2007) e 4,7 (2008).
Toda esta difícil conjuntura veio trazer uma maior aproximação entre o consumidor e as MDD, sendo possível verificar isso mesmo não só pela alteração do mix de marcas proposto pelos vários conceitos do retalho, como pelo importante crescimento que estas registaram de 2007 para 2008, colocando Portugal - com uma quota de 31,6% no final de 2008 - muito perto de países como a Espanha (32,5%) ou Holanda (33,9%), mas ainda muito distante dos 46% do Reino Unido, e à frente da França (30,7%) ou Alemanha (30,8%) .



Menos FMCG, mas mais MDD

Interessante são os dados que revelam que, apesar do gasto total em FMCG estar a diminuir, o gasto médio em MDD está a aumentar, verificando-se que, em termos de quota de mercado (%valor) nas grandes MDD, a liderança pertencer ao Lidl, tendo aumentado a quota de 17,4 para 17,7% em 2008. Aliás, o Top 3 viu as respectivas posições serem reforçadas, com o Minipreço a passar de 13,9 para 14,4% e o Pingo Doce de 10,5 para 11,9%. Do lado das descidas, aparecem o Continente, Intermarché e Feira Nova, apesar de se poder interpretar a descida nas insígnias da Sonae e Jerónimo Martins com a transferência para o Modelo e Pingo Doce, respectivamente.
No que diz respeito à repartição dos gastos em categorias básicas de alimentação, é possível verificar que o consumidor aumentou o seu gasto em categorias como os frescos, lácteos e congelados em detrimento de mercearia, higiene ou limpeza e bebidas, podendo concluir-se que o consumidor está focado nos bens essenciais em detrimento de produtos considerados supérfluos.
Assim, este estudo da TNS admite que, em 2008, a crise modificou o comportamento do consumidor, mas que as categorias alimentares resistiram à crise. E como começou 2009?


Consumo home beneficia FMCG

Com o consumidor a demonstrar cada vez mais preocupação em relação a temas como o emprego, redução nos gastos ou poupança, o primeiro trimestre de 2009 veio comprovar uma coisa: o aumento do consumo gerou um crescimento de 3,9% no gasto em FMCG. Os dados mostram que cerca de 75% do gasto dos lares portugueses na distribuição moderna é dedicado a FMCG, tendo o seu peso no total ticket passado de 73 (1.º tri. 2008) para 73,7% nos primeiros três meses de 2009, verificando-se que a subida é maior na alimentação (de 62,1 para 62,5%) do que nos DPH (9,4 para 9,5%).
De registar, contudo, que o crescimento das MDD está cada vez menos dependente dos discounts, já que, se em 2008 os super e hipermercados contribuíram 82% para o crescimento das MDD, no primeiro trimestre de 2009 essa contribuição foi de 100%.
Aliás, não deixa de ser curioso verificar que é no conceito discount que existe uma redução das marcas próprias, ao passo que nos supers e hipermercados são precisamente estas as marcas que assumem cada vez maior destaque nos lineares.
No que diz respeito ao ranking da distribuição moderna em Portugal, o Top 3 mantém os mesmos três players, embora se registe uma alteração no segundo lugar, ocupado agora pelo Pingo Doce.
A análise da TNS revela ainda que a distribuição moderna retira cada vez mais peso ao canal tradicional no total de FMCG, aumentando a quota dos players do retalho para 76,6%, enquanto o canal tradicional cai para 11,4% e que 50% do decréscimo registado pelo canal tradicional provém precisamente dos produtos frescos. Ou seja, o retorno do investimento que a distribuição moderna efectuou nos frescos é bem visível, contribuindo Intermarché, Continente, Pingo Doce e Minipreço com 95% para o crescimento dos frescos em Portugal.


O caso Mercadona

Ao longo do início de 2009, o Jornal Hipersuper tem dado diversas notícias relativamente à decisão da Mercadona ter optado por uma estratégia claramente focada na marca própria, em detrimento das marcas de fabricante, tendo mesmo anunciado que iria retirar cerca de 900 referências das suas lojas.
O recente estudo da TNS veio dar os primeiros resultados desta decisão de Juan Roig, revelando uma clara contracção no consumo em Espanha. Comparando as primeiras 11 semanas de 2008 com 2009, verifica-se que o consumidor espanhol gastava 32,6 euros por cesta/acto, enquanto nas primeiras 11 semanas de 2009 o gasto/cesta totaliza 28,8 euros, avançando a consultora que o número de artigos por cesta desceu 4%, enquanto o preço médio caiu 8%. Ou seja, menos artigos por cesta, mas com mais impacto na redução dos preços.


Fonte: Hipersuper. Publicado em New@This por Nuno Batista.

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